Você sabe qual a importância do Plano Diretor para Florianópolis? Como as mudanças do novo plano vão impactar a vida da sociedade?
A revisão do Plano Diretor de Floripa vem para contribuir para o desenvolvimento ordenado e sustentável da cidade. E é comum surgirem dúvidas sobre esse importante instrumento.
Por isso, separamos algumas das principais dúvidas sobre o plano diretor e esclarecemos os principais mitos sobre seu papel no crescimento urbano e na proteção ambiental.
Continue lendo para saber mais sobre avanços que foram alcançados com essa atualização.
Você sabe o que é um Plano Diretor?
O Plano Diretor é a principal ferramenta de organização do uso e ocupação do solo de uma cidade. É nesta lei que a cidade reflete o seu desenvolvimento e tem a oportunidade de organizar o seu crescimento de forma ordenada e sustentável. Segundo o Estatuto das Cidades, todas as cidades com mais de 20.000 habitantes precisam implementar e revisar seus Planos Diretores, no mínimo, a cada 10 anos.
Então, o crescimento é culpa do Plano Diretor?
Não. Uma cidade com ou sem plano diretor cria oportunidades e desejos de forma natural. Tanto é que o Plano Diretor atual de Florianópolis, vigente desde 2014, não foi suficiente para impedir o crescimento da metrópole. Hoje crescemos a uma taxa de 10.000 habitantes por ano e atraímos uma população flutuante (turistas de verão) de quase o dobro do nosso número de habitantes. O problema é que tal crescimento não está comportado pela lei atual, uma vez que a cidade prospera, na sua grande maioria, no mercado clandestino. Parcelamento de solo irregular, edificações clandestinas, estabelecimentos sem alvarás de funcionamento, entre outros fatores geram uma somatória de fatos que nos demonstra que algo não está certo.
E se fizermos um Plano Diretor mais dinâmico, estamos destruindo o meio ambiente?
De forma alguma. O meio ambiente, tanto em Florianópolis como no restante do país, é protegido por leis federais. Os governantes municipais não têm o poder de reduzir a proteção sobre as áreas protegidas ambientalmente pela legislação federal. O único poder que o município tem é de ampliar as restrições ambientais caso decida que queira proteger alguma área que as leis federais não protegem.
Então, quando se vê a sigla APP – Área de Preservação Permanente nos mapas do Plano Diretor de uma cidade não quer dizer que ali seja realmente uma APP. Hoje existem APP’s pintadas nos mapas de zoneamento consideradas áreas urbanizáveis, da mesma forma que existem áreas pintadas como urbanas que são APP’s. E essa confusão só nos traz uma coisa: insegurança jurídica.
Caso um cidadão seja proprietário de uma área urbanizável e o município a torne APP baseado apenas no achismo, este cidadão terá o direito de cobrar judicialmente os cofres públicos por tamanho prejuízo a ele causado.
E sabe quem irá pagar a conta? Todos nós, afinal o dinheiro público é nosso e poderia estar sendo utilizado para algo útil. Portanto, fique tranquilo. O que determina uma APP não é a cor ou a sigla do mapa, são critérios técnicos tais como declividade, restinga fixadora de dunas, banhados naturais, vegetações nativas, entre outros.
E essa tal revisão aí, passou por um processo realmente sério?
Sem dúvidas. A cidade vem discutindo a revisão desde 2016, portanto os cidadãos e entidades engajadas no tema já estão falando das problemáticas há pelo menos 7 anos. Após isso, ao sofrer uma interferência popular, o Ministério Público de Santa Catarina determinou ao município um roteiro a ser implantado para que se pudesse promover a atualização da lei.
De lá pra cá foi composto o Conselho da Cidade, previsto no Estatuto das Cidades, em processo eleitoral digno. Posteriormente, o município promoveu 14 audiências públicas que percorreram todos os bairros da ilha da magia. Após ouvir as comunidades, o executivo preparou uma minuta inicial do texto de lei e submeteu à análise do Conselho da Cidade, que por sua vez fez uma relatoria de melhorias possíveis.
Já no final do processo, dentro do Conselho da Cidade, houve votação artigo a artigo e os membros puderam optar pelas melhores propostas para a sociedade. Uma vez entregue a minuta ao poder legislativo, o mesmo realizou mais 5 audiências públicas com a prerrogativa dos vereadores.
Feito isso, na primeira votação em plenária do poder legislativo historicamente se decidiu que não haveriam emendas no projeto de lei. Desta forma, por mais que alguns vereadores tenham apresentado suas propostas, a maioria entendeu que o projeto já havia sido amplamente discutido e que as propostas para sua revisão estavam adequadas.
O que melhorou com a revisão do plano diretor de Florianópolis?
Essa é uma boa pergunta, apesar de complexa devido ao fato de se traduzir mais de 300 artigos em uma só resposta. Mas de forma conceitual, separamos por áreas de interesse e trouxemos algumas respostas:
Meio ambiente
Talvez o principal ponto aqui seja a inversão de preservação para conservação do meio ambiente. Entende-se que preservação é intocável e na conservação existe interação.
Assim, ao invés de fazer como hoje e “preservar” as restingas que antecedem as praias, que na prática resultam na abertura de novos caminhos sobre elas todos os dias, o que determina o novo plano é “conservar”, dando a opção de construir sobre a restinga um deck elevado de acesso a praia.
Dessa forma, novos caminhos não são abertos, as espécies podem atravessar sob o deck de forma tranquila e a vegetação se regenera de forma muito mais eficaz. São conceitos de países desenvolvidos que podem nos ajudam a conservar e desenvolver Florianópolis.
Da mesma forma, ao se trocar a nomenclatura de APP Área de Preservação Permanente por ZIP – Zona de Interesse de Proteção, nós continuamos com 100% da proteção necessária, mas eliminamos a insegurança jurídica sob essas áreas e os novos passivos financeiros que o município possa vir a estar refém. Atitude responsável tanto com o meio ambiente como com os cofres públicos.
Outro ponto a se destacar é a criação do TDC-V (Transferência do Direito de Construir Verde). Uma iniciativa lastreada no fundamento de servidão ambiental do Código Florestal, inteligente, e com o intuito de gerar interesse na conservação de APP’s
Na prática, ao se conservar uma área de proteção de interesse de todos, o proprietário é recompensado com um índice construtivo na zona urbana passível de edificação. Este item ainda depende de regulamentação, mas a ideia é de que até mesmo áreas degradadas, ocupadas irregularmente, possam ser recompradas e recondicionadas ambientalmente.
Mobilidade Urbana
O Plano foi pensado sobre o conceito DOTS – Desenvolvimento Orientado de Transporte Sustentável. Isso significa que a intenção é aproximar as áreas mais adensadas do transporte público, democratizando assim o acesso da população e fazendo com que o maior número de pessoas utilize de meios de transporte comuns no dia a dia.
Essa ação visa retirar o alto fluxo de veículos das ruas nos horários de pico e oportunizar a proximidade entre moradia e emprego para a população através do transporte. Além disso, o conceito de multicentralidade visa equilibrar a oferta de moradia e emprego nos próprios bairros, evitando assim os grandes deslocamentos. É claro que é impossível neutralizar em 100%, mas a revisão do plano diretor de Florianópolis deve resolver grande parte deste problema. Além disso, este conceito também resolve os pequenos problemas e ações do dia a dia, como o simples fato de poder ir comprar pão na padaria sem precisar pegar o carro.
Adensamento
Para falar de adensamento é preciso falar de meio ambiente. Florianópolis é uma cidade chamada 70/30, onde 70% do seu território é extremamente preservado ou tem zonas mais sensíveis ambientalmente que recebem pouco índice urbanizável. Dessa forma, os 30% urbano que lhe restam precisam pagar a conta de 100% do custo da cidade.
Considerada a capital de um dos estados mais produtivos do país, aqui se concentram a maior parte das sedes das instituições públicas do estado e até mesmo do país. Temos também a Universidade Federal de Santa Catarina, que desde a década de 70, quando foi implantada, acelerou o crescimento da ilha.
Além disso, hoje como um polo tecnológico. Assim, é utópico pensar que a cidade ainda é aquela de anos atrás. O sucesso do nosso desenvolvimento está em preservar o nosso meio ambiente, não perder o nosso clima pitoresco, mas adensar mais onde se pode para que possamos aderir aos novos moradores. Seja quem vem de fora ou quem nasce aqui e precisa de novas oportunidades.
Verticalizar será necessário para que a conta da infraestrutura pública, tanto de implantação como de manutenção se pague. Essa é uma relação diretamente proporcional onde o custo de infraestrutura é diretamente proporcional à extensão territorial da mesma.
Logo, com a mesma infraestrutura que atende-se um lote com uma casa, atende-se um lote com um prédio de 5 andares e assim a eficiência do dinheiro público passa a fazer sentido. Claro, verticalizar Floripa não é fazer arranha céus, afinal a nossa identidade é a nossa alma.
Políticas Sociais
Na Associação Empresarial de Florianópolis entendemos que não há política social mais eficaz do que a geração de emprego e renda. Um Plano Diretor que permite o crescimento da cidade de forma regular, oportunizando empregos formais, coincide com a melhor ferramenta do mundo para a dignidade da população: o trabalho.
Ter oferta de trabalho talvez seja o maior desafio que temos pela frente. Além disso, avaliamos que o novo plano também democratiza as áreas para construção de habitação social, não mais demarcando nos mapas, mas sim espalhando para a cidade inteira. Ainda neste ponto, vemos a iniciativa de permitir com que moradias produzidas pelo poder público ou privado sejam de propriedade pública e possam permitir uma ocupação de baixa renda via aluguel meramente irrisório que cubra os custos de manutenção dessas edificações. Isso é novidade total e tem o lastro de sucesso em países desenvolvidos.
Pela primeira vez entendemos que o Plano Diretor está criando medidas que privilegiam os mais pobres. Quando se diminui o lote mínimo, se diminui o valor da terra. Quando se gera incentivo por habitação social, estimula-se a confecção das mesmas. E quando se gera multicentralidade, diminui-se o custo de transporte até o trabalho, gerando qualidade de vida e menos tempo perdido por dia no trânsito. Assim, uma série de medidas vão nortear uma cidade mais democrática e melhor para todos.
Dos incentivos a construção
Não tendo uma cidade para iniciar do zero, é preciso transformar ao invés de criar. Mas sem incentivo não há transformação. Logo, quando falamos em “fruição pública” estamos falando em criar acessos públicos por terrenos privados, seja para praças, acesso a praia ou conexão entre ruas.
Quando falamos em “sustentabilidade” estamos falando de menos consumo de energia, menos consumo de água potável e reaproveitamento de água da chuva.
Por meio do “uso misto”, podemos oportunizar empregos mais próximos às residências ou permitir uma padaria naquelas áreas em que precisamos pegar o carro para ir comprar pão.
A “adequação de imóveis” vem para unir terrenos com testada (frentes) pequenas voltadas para uma avenida fazendo com que a construção futura seja mais humana, concorde com a avenida, traga aspecto harmônico para todos.
E quando falamos em “em TDV-V” tratamos de estimular a conservação ambiental e regenerar áreas degradadas.
A política de incentivos vem lastreada como um agente transformador para que a cidade possa substituir aquilo que não faz sentido, para que possa se regenerar em torno de coisas que são melhores para todos. Sendo assim, é válida a premiação por meio de maior potencial construtivo a quem se submete a tais melhorias.
Saneamento básico
Apesar do tema saneamento não ser especificamente uma questão de plano diretor, é diretamente impactado por ele. Vejamos os números da cidade sob regulação do plano atual (desde 2014):
- 30 mil lotes abertos no cadastro imobiliário, apenas 900 de forma regular
- Aproximadamente 5 mil unidades clandestinas construídas somente no Sul da Ilha
- Apenas 11 alvarás de loteamento concedidos, ao passo que o ministério público registrou 213 casos de parcelamento irregular de solo.
No mercado irregular os sistemas de tratamento de esgoto são sub dimensionados e isso gera um caos para o saneamento básico. O que os sistemas executados não dão conta de absorver é absorvido pelo nosso solo, chega até o lençol freático que se comunica com os rios e por consequência ajuda na causa do que vemos nos noticiários: rios e mares cada vez mais poluídos.
O novo plano diretor, ciente de que o crescimento acontece mesmo que a lei não queira, faz com que possamos diminuir a incidência de mercado clandestino, fazendo com que novos empreendimentos possam ser submetidos à aprovação dos órgãos competentes e possibilitem maior controle ambiental.
Fora isso, considerando o baixo índice de cobertura de esgotamento sanitário do município, será preciso força massiva para, através de outros dispositivos jurídicos e medidas na prática, mudarmos o cenário da capital. Entre as tantas frentes a serem mobilizadas, talvez a principal seja a consciência cidadã.
Aliás, você já se perguntou como anda o seu tratamento de esgoto? Em um futuro sustentável essa resposta precisa estar na ponta da língua, sobretudo, das crianças.
O novo Plano Diretor de Florianópolis deve impactar também em outras áreas, com destaque para:
Impactos no Turismo
Como já mencionado acima, no verão a população de Florianópolis duplica de tamanho devido a população flutuante atraída pelo turismo. O Plano Diretor visa democratizar a implantação de hotéis, equipamentos públicos, mobilidade urbana, sustentabilidade e diversos fatores que farão de Florianópolis uma cidade cada vez mais atrativa para o turismo.
Onde isso nos ajuda? Investindo o dinheiro que o turista deixa aqui podemos dar respostas de melhorias de diversas discussões acima destacadas, como o investimento em saneamento básico e na infraestrutura necessária para melhor qualidade de vida de todos, incluindo turistas e os moradores da nossa cidade.
Impactos na segurança pública
O alto índice de irregularidades gera impactos negativos na segurança pública. A falta de planejamento na ocupação urbana cria ambientes favoráveis aos crimes. O novo plano diretor visa a ocupação dos espaços de forma mais organizada. Como, por exemplo, o centro da cidade.
Você hoje se sente tranquilo em caminhar no centro às 11 horas da noite? Provavelmente não. Isso porque o Plano Diretor atual não permite que prédios atualmente comerciais sejam transformados em residenciais.
O Centro se tornou exclusivamente comercial, sem vida noturna. O que cria o ambiente favorável à prática de ilicitudes. Com o novo plano poderemos transformar prédios antigos em residências dando mais vida ao centro da cidade. Onde a população ocupa, a segurança pública tem menos trabalho.
Contagem regressiva
Agora que você viu como o Plano Diretor é um instrumento importante para o desenvolvimento ordenado e sustentável das cidades fica mais claro entender como é fundamental a participação da sociedade na revisão e acompanhamento dessas mudanças.
A revisão do Plano Diretor de Florianópolis representa um importante avanço para a cidade, e é preciso continuar monitorando e promovendo o cumprimento das diretrizes estabelecidas.
No próximo dia 24 de abril, às 16h, será realizada na câmara de vereadores de Florianópolis a segunda e última sessão para votação do projeto de lei. Esse é um momento importante para que a sociedade possa participar ativamente na definição do seu futuro, confiante em um desenvolvimento ordenado e sustentável.